Purplee logo Reparações Deslocações Parcerias Onde estamos Sobre nós Avaliações Contactos
×
Reparações Deslocações Parcerias Onde estamos Sobre nós Avaliações Contactos Blog


A crise dos chips

Já todos ouvimos falar da crise dos semicondutores ou crise dos chips, uma crise que afectou vários sectores, como por exemplo na indústria automóvel e nas empresas de tecnologia e que causou atrasos consideráveis nas entregas em automóveis, smartphones ou computadores. Mas para compreender as razões desta crise precisamos de conhecer primeiro a complexa realidade da indústria destes componentes electrónicos.

Primeiro temos de distinguir entre semicondutores, dice, chips ou circuitos integrados e circuitor impressos. Os semicondutores são materiais físicos (silício por exemplo) capazes de conduzir corrente elétrica e cujas propriedades químicas são ideais para a produção dos chips. Já o que chamamos vulgarmente "chips" (proveniente do inglês), que são também conhecidos como "microchips", "nanochips" ou circuitos integrados, são essas pequenas "fatias" de silício gravado com um circuito microeletrónico (geralmente menor que um grão de arroz) encapsulados em plástico ou cerâmica. Este chip é composto por centenas, milhares ou milhões de componentes que armazenam, movem e processam informações e são geralmente conectados a uma placa de circuito impresso. Chamamos vulgarmente chips ou circuitos integrados a estes pequenos componentes mas convém lembrar que, tecnicamente, a placa de silício que está dentro da cápsula chama-se "die" ou "dice" no plural ("lasca" ou "pastilha" em português) e é este "die" encapsulado que consiste no "chip".


Para ilustrar estes conceitos, imagine uma bolacha redonda do estilo wafer (chama-se mesmo wafer) de silício onde são gravados de forma microscópica (nanotecnologia) os circuitos previamente desenhados por uma equipa de engenheiros eletrotécnicos. Essa bolacha recebe diversos tipos de polimentos e tratamentos químicos e é depois cortada em pequeníssimas pastilhas ("die" ou "dice" no plural - aqueles quadrados dourados). Estas pastilhas são depois colocadas numa cápsula de plásticou ou cerâmica. Dentro dessa cápsula existem ligações finíssimas que conectam o chip a uns pinos (ficam a parecer uma aranha) que são na prática os terminais do circuito integrado (as patas da aranha) que depois conectam à placa de circuito impresso (aquelas placas geralmente verdes com centenas de ligações). Essa placa tem linhas condutoras a ligar os diferentes componentes soldados por solda de estanho (capacitores, transistores, resistores, chips, etc.). Costumam também ter uma legenda, para identificar os componentes e assim facilitar a manutenção. Os circuitos integrados têm componentes e conexões tão pequenos que é impossível uma reparação sem os destruir. Pelo contrário, os circuitos impressos podem ser reparados.

Para dar um exemplo da importância dos chips, um automóvel como um Dacia Duster pode precisar de pode precisar de 180 chips para fazer funcionar todos os sistemas, já um Tesla Model 3 usa em média 1380 chips e um Mercedes-Benz Classe S necessita de nada mais nada menos do que 2444 chips.

Mas porquê a crise dos chips?



Foram vários os factores que desencadearam esta crise na supply-chain da indústria dos semicondutores. Em 2020 com o encerramento ou redução da produção nas fábricas de chips em virtude da pandemia de COVID19, muitas fábricas suspenderam as encomendas dos seus Clientes. Com as pessoas em casa e com o aumento do home office e da educação à distância a venda dos aparelhos eletrónicos aumentou exponencialmente e a pouca produção de chips foi, então, direcionada para esses mercados pois a necessidade era mais relevante do que por exemplo para televisões ou automóveis. Quando a indústria automóvel aumentou o ritmo de produção, ficaram "no fim da fila" para receberem os chips.

Mas são as questões de bastidores da geopolítica que têm forte impacte na economia mundial e não é excepção a questão dos chips. As grandes fabricantes mundiais de chips estão em Taiwan e na China, mais concretamente a TSMC e a UMC em Taiwan e a SMIC e a Globalfoundries na China. Em 2022 numa série de medidas de retaliação tomadas pela China contra Taiwan, estão entre estas medidas a proibição da exportação de areia de silício da China para Taiwan, que é um país altamente dependente destes recursos. Mas porquê? Ora se pensarmos que a fabricação de chips equivale a 15% do PIB de Taiwan e responde por quase 40% de suas exportações percebemos porquê. Também entendemos que estas restrições visam proteger a centralização de uma indústria que vale 147 bilhões de dólares. Podemos assim entender o porquê destas restrições a Taiwan ou a súbita necessidade dos Estados Unidos em construir fábricas de podução de chips.

Curiosamente enquanto o mundo está focado no impacte económico na inflação do petróleo e do gás, pode ser estranho saber que a areia continua a ser um recurso natural tão valioso quanto estes o petróleo, o gás ou a água.

Para "ajudar" à situação, no final de 2020, a administração Trump dos Estados Unidos incluíram a maior fabricante de chips da China, a SMIC (Semiconductor Manufacturing International) numa lista negra de empresas com acesso a tecnologias de ponta desenvolvidas nos EUA numa tentativa de impedir que a China tivesse acesso a tecnologia que pudesse usar na sua indústria militar, uma medida que a impediu de manter sua capacidade total de produção.

Também no sector da aviação a pandemia de COVID-19 afetou gravemente todo o setor, tendo o tráfego aéreo diminuído mais de dois terços em relação aos níveis de 2019 e uma vez que os chips, pela sua leveza, viajam na área de carga de aviões convencionais, também por aqui a distribuição foi afetada.

Também em duas das maiores fábricas de chips no Japão a produção foi afectada por dois incêndios, um em outubro de 2020 na fábrica da Asahi Kasei Microsystems e outro março na fábrica da Renesas Eletronics.

A nível climático, em 2016, a Parceria Internacional para a Cooperação em matéria de Eficiência Energética (IPEEC) lançou um documento ao qual a China está vinculada e em que se define uma estratégia de restrições energéticas e ambientais. este documento compromete a China nas restrições de emissões de dióxido de carbono (CO2), melhoria mínima da eficiência energética, um limite ao consumo de energia proveniente do carvão e um requisito mínimo de energia proveniente de fontes renováveis. Com tudo isto, a China para além de limitar os tempos de laboração das fábricas, teve também de restringir as emissões de gases com efeito estufa, o que reduziu também a produção de chips.

Se analisarmos agora em perspectiva e percebermos que a construção de uma fábrica de chips, pode demorar mais de cinco anos, percebemos que é um problema de longo prazo. Por outro lado, as empresas produtoras já anunciaram planos de expansão, como a Intel, que pretende investir 20 biliões de dólares para a construção de duas novas fábricas no Arizona, nos Estados Unidos.

Além disto numa cultura altamente digital como a nossa, os semicondutores são utilizados em praticamente tudo, sensores, smartphones, videojogos, computadores, automóveis, motas, televisões, etc. A utilização em veículos foi o que fez a procura crescer nos últimos anos e esta procura deve aumentar ainda mais com a crescente produção de veículos elétricos. Vale lembrar que a União Europeia pretende proibir a venda de veículos com motor de combustão a partir de 2035...

Pensamos que com estas informações, conseguimos dar uma pequena ideia do que originou a crise dos chips.

3 Janeiro 2023 | Gonçalo Sousa